Essa
época que vai do Natal ao ano novo é um período em que faz bem refletir sobre
as questões mais amplas. Isso porque, qualquer que seja a compreensão que temos
da vida humana, é na relação com o sentimento dos outros que vão se definindo
nossos valores.
Historicamente,
a intolerância social está associada às religiões, principalmente às grandes
crenças monoteístas, podendo chegar aos níveis mais extremos, como na
inquisição espanhola. É o que o escritor José Saramago chamou de fator Deus,
que pode ser ilustrado pelas atrocidades cometidas pelo Estado Islâmico na
Síria e no Iraque: “De algo sempre haveremos de morrer, mas já se perdeu a
conta aos seres humanos mortos das piores maneiras que seres humanos foram
capazes de inventar. Uma delas, a mais criminosa, a mais absurda, a que mais
ofende a simples razão, é aquela que, desde o princípio dos tempos e das
civilizações, tem mandado matar em nome de Deus”.
A
intolerância é uma atitude de ódio sistêmico e de agressividade irracional com
relação aos indivíduos e grupos específicos, à sua maneira de ser, o seu estilo
de vida e ás suas crenças e convicções políticas.
A intolerância política, porém, não é um
resultado direto dessa contradição. Surge na esfera da luta pelo poder e das
disputas de natureza ideológica.
Foi
assim nas rebeliões do período regencial, nas revoltas tenentistas, na
Revolução de 1930, no levante comunista de 1935, no suicídio de Getúlio Vargas
e no golpe de 1964.
No
Brasil, há muita intolerância, aberta ou dissimulada. Desigualdade social,
discriminação racial e preconceito de classe, tudo junto e misturado. Em casa,
no trabalho, nas escolas, nos meios de comunicação, onde menos se espera surgem
as intolerâncias políticas, religiosa, cultural, étnica e sexual. Elas emergem
como conflito entre indivíduos, mas muitas vezes resultam da relação entre o
estado e a sociedade, o governo e a oposição. É aí que surge um ódio fundado na
razão.
Há
221 anos, Robespierre prometeu que iria instalar o império da sabedoria,
justiça e virtude na França. Decapitou 1.400 pessoas em 49 dias. Governou pelo
terror, que ele julgava ser uma expressão da virtude.
É
bom ver o povo nas ruas, cada um defendendo o que quiser. E pedindo a cabeça de
prefeito, governador, de presidente, ou de quem desejar.
O bate- boca envolvendo o compositor e cantor
Chico Buarque e um grupo de jovens da elite carioca é apenas uma gota d’água nesse
oceano, mas inaugura um novo capítulo da radicalização política no Brasil, que
opõe o governo e a oposição. Só preciso lembrar que o país não é um time de
futebol que, quando vai mal, muda o técnico.
O
problema brasileiro hoje é mais moral do que ideológico. Oposição e governo
estão nas cordas bambas, ambos hostilizados, e se não houver algum tipo de
esforço conjunto para recuperar o crédito social, o país ficará de protesto em
protesto, sem ganhar nada.
Herbert Lago Castelo Branco
Poeta e Escritor
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